quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

O que nos move? texto de Bertrand Russell

 

O que nos move?

Procuramos o quê?

Buscamos o que queremos?

Um texto maravilhoso de Bertrand Russell, um dos mais influentes matemáticos, filósofos, ensaístas, historiadores e lógicos que viveram no século XX.

“Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governaram minha vida: o anseio pelo amor, a busca pelo conhecimento e uma dolorosa piedade pelo sofrimento da humanidade. Essas paixões, como grandes vendavais, impeliram-me para aqui e acolá, em  curso, instável, por sobre o profundo oceano de angústia, chegando às raias do desespero.

Busquei o amor, primeiro, porque ele produz êxtase – um êxtase tão grande que, não raro, eu sacrificava todo o resto da minha vida por umas poucas horas dessa alegria. O busquei, ainda, porque o amor nos liberta da solidão – essa solidão terrível através da qual nossa trêmula perceção observa, além dos limites do mundo, esse abismo frio e sem vida.  Busquei-o, finalmente, porque vi na união do amor, numa miniatura mística, algo que prefigurava a visão que os santos e os poetas imaginavam. Isso foi o que busquei e, embora isso possa parecer demasiado bom para a vida humana, foi isso que – afinal – encontrei.

Com paixão igual, busquei o conhecimento. Eu queria compreender o coração dos homens. Gostaria de saber por que cintilam as estrelas. E procurei apreender a força pitagórica pela qual o número permanece acima do fluxo dos acontecimentos. Um pouco disto, mas não muito, eu alcancei.

Amor e conhecimento, até ao ponto em que são possíveis, me levaram para o alto, rumo aos céus. Mas a piedade sempre me trazia de volta à terra. Ecos de gritos de dor ecoavam em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressore



s, velhos desvalidos a construir um fardo para seus filhos, e todo o mundo da solidão, pobreza e sofrimentos, convertem numa irrisão o que deveria ser a vida humana. Anseio por afastar o mal, mas não posso, e também sofro.

Eis  o que tem sido a minha vida. Tenho-a considerado digna de ser vivida e, de bom grado, tornaria a vivê-la, se me fosse dada tal oportunidade.”

Bertrand Russell (1872-1970), no prólogo da sua autobiografia, "What I have lived for"

                       

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